Fr. IOAÕ DA SYLVEYRA illustre credito da Cidade de Lisboa onde naceo a 30 de Agosto de 1592. sendo filho de Fernaõ Lopes de Lisboa, e Catherina Fernandes, como da Religiaõ Carmelitana cujo habito recebeo no Convento da Villa de Setubal a 13 de Agosto de 1611. quando contava desanove annos de idade. Estudou em o Collegio de Coimbra as sciencias escholasticas, que dictou com aplauzo nos Conventos de Evora, e Lisboa cuja sciencia se fazia mais estimavel pela modestia do semblante, e humildade do genio. Depois de ter profundamente examinado as dificuldades da Theologia Especulativa, Moral, e Ascetica se dedicou com indefessa aplicaçaõ a penetrar os arcanos da Sagrada Escritura valendo-se das luzes dos Santos Padres, e dos mais insignes Interpretes para descubrir o Verdadeiro sentido da Palavra divina oculta em as mysteriosas sombras dos Vaticinios dos Profetas. Desta continua liçaõ se illustrou o entendimento, e inflamou a vontade para revelar com a penna a vasta, e profunda intelligencia, que alcançara das letras sagradas emprendendo formar hum Comento ao Texto Evangelico cuja ardua empreza gloriosamente dezempenhou em seis grandes volumes eternos padroens da sua fecunda erudiçaõ, e penetrante agudeza com que extrahio do sentido litteral a multiplicidade de conceitos moraes, e politicos para ornato dos Discursos concionatorios. A fama do seu nome se divulgou com tal excesso por toda a Europa, que naõ havia homem grande, que viesse a Portugal, que logo quizesse testemunhar com os olhos o que tinha percebido pelos ouvidos, distinguindo-se entre todos o Reverendissimo Fr. Jozè Ximenes Samaniego Ministro Geral da Religiaõ Serafica, e Grande de Espanha, que falleceo Bispo de Segovia o qual chegando no anno de 1678. ao Real Convento de S. Francisco desta Corte antes de ser conduzido para o apozento destinado por taõ grave Communidade quiz, que o conduzissem ao Convento do Carmo para ver ao Mestre Sylveira com quem esteve algumas horas admirando a sinceridade, e modestia virtuosa de taõ insigne Varaõ, levando alguns dos seus companheiros como reliquias da erudiçaõ sagrada as pernas, e tinteiro, que lhe serviam para a composiçaõ das suas obras. Merecendo tantas estimaçoens pela sua Sabidoria ainda era credor de outras mayores pela severa observancia da vida regular. Era taõ rigido cultor da pobreza, que cobrando annualmente mil ducados, que lhe deixara por legado sua Irmãa a Baroneza D. Brites da Sylveira como consta do seu Testamento impresso fol. 14. vers. n. 49. e rendendo-lhe copioso dinheiro as suas obras tudo dispendia em o culto de Deos, e beneficio da sua Religiaõ mandando fabricar o Retabolo da Capella mòr do Convento de Lisboa em q compete a preciosidade com o artificio; o cofre de prata guarnecido de pedras de grande valor, que serve de depozito ao augustissimo Sacramento do Altar, e a Caza da Livraria ornada de elegantes pinturas, e livros exquisitos. Todas as alfayas da sua Cella se reduziaõ a huma pobre cama sobre cuja cabeceira pendia huma Cruz de pinho, duas cadeiras, e huma banca em que escrevia. Conservou por todo o espaço da vida, como no fim della declarou illeza a flor da Castidade. Mais amante de obedecer, que de mandar nunca quiz aceitar Prelazia, e obrigado pelo Geral Fr. Ieronimo Ari foy Presidente do Capitulo celebrado em Lisboa a 13 de Mayo de 1664. cujo lugar teve mais duas vezes, que foraõ a 8. de Abril de 1674. e a 8 de Mayo de 1677. constrangido dos preceitos dos Geraes Fr. Matheos Orlando, e Fr. Emilio Iacomelli. Unicamente foy Definidor perpetuo da Religiaõ eleito em o Capitulo Geral celebrado em Roma a 16 de Mayo de 1660. Naõ se altercou controversia grave em seu tempo, que della naõ fosse consultado pelas pessoas da primeira Ierarchia, cuja resoluçaõ como estabelecida em fundamentos solidos, e mais conformes a rectidaõ da cõciencia era preferida aos votos de outros grandes Letrados. Para defender a Immunidade Ecclesiastica insultada pela authoridade dos Ministros Regios foy eleito Procurador em o anno de 1633. pelo Illustrissimo Colleitor Alexandre Castracani, e na Corte de Madrid sustentou naõ somente com a voz, mas com a penna a justiça de taõ importante cauza. Cumulado de religiosas virtudes passou de caduco a eterno em o Convento de Lisboa a 17 de Iulho de 1687. quando contava a provecta idade de 94. annos 10 mezes, e 13 dias; de religioso 75 annos 11 mezes, e 4 dias. O sentimento da sua morte correspondeo à estimaçaõ da sua vida. Iaz sepultado no Cemiterio novo, e sobre a pedra sepulchral se lhe gravou o seguinte Epitafio.
Siste lector.
Híc jacet
Carmeli doctissimus Doctor
Sapiens, et humilis,
Pauper, sed magnanimus,
PATER SYLVEYRA
Libris incumbens, Deo impensius
Studuit, scripsit, composuit:
Nil habens litteris pretiosus
Praeter virtutem.
Nobis exempla, Lysiae decorem,
Famam aeternitati relinquens,
Sicut vixerat mortuus est
In Osculo Domini.
Ne decedas quin dicas
Requiescat in pace.
Obiit die 17 Julii anno 1687.
He celebrado o seu nome por diversos Authores como saõ Antonio de Souza Macedo Eva, e Ave. Part. 2. cap. 15. n. 12. Escritor mais insigne do nosso seculo, e Lustre grande desta sua patria. e cap. 20. n. 5. doutissimo Padre, e lustre de Portugal em seus excellentes escritos. D. Franc. Man. de Mello Cart. dos AA. Portug. ao Doutor Themudo Por quem pode fallar a estimaçaõ dos seus Escritos. Fr. Ant. à Matr. Dei. Apis Libani. in 10. Cap. Proverb. Flor. 1. Delibat. 1. n. 5. indefessus, et perdoctus Evangeliorum illustrator. Illustrissimo Barzia Despert. Christ. Tom. 1. Serm. 10. n. 11. grande Expositor del Evangelio, e Tom. 2. Serm. 24. n. 21. docto; e no Tom. 2. do Queresmal Serm. 25. n. 20. Erudito Hozes zelo Pastoral. Explic. dela Propos. 64. n. 32. eruditissimo Maestro D. Emman. Caiet. de Souz. Exped. Hisp. S. Jacob. Tom. 2. pag. 1325 . §. 369. Carmelitarum decus. Sá Mem. Hist. dos Escrit. Portug. do Carmo. cap. 52. pag. 230. Honra desta Provincia, lustre da Carmelitana Familia, e credito da Naçaõ Portuguesa cujo insigne nome basta para milhor Elogio da sua vida, e acçoens, que o fizeraõ conhecido naõ só neste Reyno, mas em os estranhos pois de todos foy venerado por hum sogeito eminente; e nas Mem. Hist. da Prov. do Carm. De Portug. pag. 184. Heroe, que pela sciencia, e virtudes illustrou a Religiaõ, e o Reyno como se vè da veneraçaõ, que tem em todo o mundo os seus escritos tantos, e taõ multiplicadamente impressos. Costa Corog. Portug. Tom. 1. pag. 630. Varaõ doutissmo nas Divinas, e Humanas letras, cuja memoria será eterna em todos os seculos pelos muitos, e eruditos livros, que compoz sobre a Sagrada Escritura, sogeito, que naõ só acreditou a Religiaõ, mas tambem illustrou a Naçaõ Portuguesa. Imbonati Bib. Lat. Heb. pag. 421. n. 1240. Lelong. Bib. Sacr. pag. Mihi 979. col. 2. Nicol. Ant. Bib. Hisp. Tom. 1. pag. 598. col. 1. Fr. Daniel à Virg. Mar. Specul. Carmel. Part. 2. Tom. 2. fol. 1078. n. 3778. Compoz
Commentaria in Textum Evangelicum primus Tomus. Ulyssipone apud Antonium Alvres. 1640. fol. Lugduni apud Gabrielem Boissac. et Laurent. Anisson. 1645. fol. Matriti apud Gabrielem de Leon. 1648. fol. Lugduni apud Laurentium Anisson. 1662. fol. et ibi 1667. fol. Antuerpiae apud Viduam Henrici Aertsens 1665. fol. Et ibi apud Lucam de Poter 1665. fol. Lugduni apud Anissonianos et Possuel 1697. fol.
Tomus secundus. Lugduni apud Gabrielem Boissat, et Laurent. Anisson. 1645. Matriti apud Gabrielem de Leon. 1648. fol. Lugduni apud Boissat, et Anisson. 1662. e 1667. fol. Antuerpiae apud Viduam Henrici Aertsens 1665. fol. et ibi apud Lucam de Poter 1665. & Lugduni apud Anissonianos 1697. fol.
Tomus Tertius Lugd. apud. Boissat et Anisson. 1645. fol. & ibi apud eosdem 1652. 1662. e 1667. Antuerpiae apud Viduam Henrici Aertsens 1665. fol. e Lugd. apud Anissonianos. 1697. fol.
Tomus Quartus Lugduni apud Laurentium Anisson 1649. fol. ibi per eumdem 1656. 1657. 1662. 1668. Antuerpiae apud Viduam Henrici Aertsens 1665. fol. Et Lugduni apud Anissonianos 1697. fol.
Tomus Quintus. Lugduni apud Laurentium Anisson 1659. fol. et ibi apud eumdem 1662. e 1668. fol. et ibi apud. Anissonianos. 1697. fol.
Tomus sextus. Lugduni apud Laurentium Anisson 1672. fol. Antuerpiae apud Hyeronimum Verdussen 1676. fol. et Lugduni apud Anissonianos 1701. fol.
Commentaria in Apocalypsin D. Ioannis Apostoli Tomus primus. Lugduni apud Laurent. Anisson 1663. fol. et Antuerpiae apud Viduam Henrici Aertsens 1667. fol. et ibi apud Lucam de Poter 1666. fol.
Tomus secundus. Lugd. apud Anisson 1669. fol. et Antuerpiae apud Viduam Henrici Aertsens 1668. fol.
Commentaria in Acta Apostolorum cum quadam Apologia Carmelitana. Lugd. apud Anisson et Possuel 1681. col. et ibi apud eosdem 1687. fol.
Opuscula Varia Lugd. ex Officina Anissoniana 1675. fol.
Todos estes dez Volumes sahiraõ ultimamente Venetiis apud Ludovicum
Lovisa 1728. fol.
Sermaõ nas primeiras Exequias do Serenissimo Principe o Senhor D. Theodozio filho delRey Nosso Senhor D. Ioaõ o IV. as quais a 27 de Mayo deste prezente anno celebrou a Religiaõ de Nossa Senhora do Carmo no Real Convento de S. Ieronimo de Belem. Lisboa por Antonio Alvares Impressor delRey 1653. 4.
Sermaõ pregado no Convento de S. Filippe dos Carmelitas Descalsos em o sexto dia do solemne Outavario da Canonizaçaõ de Santa Maria Magdalena de Pazzi. Sahio na Part. 2. do Forasteiro Admirado a pag. 79. Lisboa por Antonio Rodrigues de Abreu. 1672. fol.
Tractatus in quo deciditur an religiosa domus teneatur servare interdictum qui supposta est Paraecia vicina non Ecclesia Cathedralis. Conservase M. S. na Livraria do Convento do Carmo de Lisboa, e he citado por Fr. Antonio do Espirito Santo Direct. Morale Tract. 12. de Interdict. disp. 5. Sact. 1. n. 736.
Tractatus de Tertiariis quos possunt habere Carmelitae. Conservase M. S. na mesma Livraria, e he citado por Lezana Sum. Quaest. Regul. Tom. 2. cap. 14. n. 7. Barbosa. Collect. Apost. Decis. Decif. DCC. e Fr. Iozé de Santa Maria Tract. De Tertiariis n. 28. e 32.
Tractatus de Incarnatione.
Tractatus de Legibus.
Tractatus de Immunitate, ac libertate Ecclesiastica. Todos estes Tratados se conservaõ M. S. na Livraria do Convento do Carmo.
Compendium in doctrinam Aristotelis. fol. M. S. Conservase no Collegio do Carmo de Coimbra.
[Bibliotheca Lusitana, vol. II]