ANDRÉ DA SILVA MASCARENHAS, Doutor em Leis pela Univ. de Coimbra, Desembargador da Relação do Porto, de que tomou posse a 20 d’Agosto de 1673. – Consta que fora natural de um logar da Beira alta, nos limites do bispado de Lamego; mas não temos noticia alguma das datas do seu nascimento e obito. – E.

329) (C) A Destruição de Hespanha, Restauração Summaria da mesma. Ao Principe D. Pedro Nosso Senhor, etc. Lisboa, por Antonio Craesbeeck de Mello 1671. 4.º de XII‑305 pag.

É um poema heroico que consta de nove livros ou cantos em oitava rima. Posto que contenha alguns trechos não totalmente destituidos de merecimento poetico, e seja menos isolado das affectações, conceitos e trocadilhos que com tanto excesso se encontram nos poetas contemporaneos da eschola castelhana, não pode todavia considerar‑se senão como uma epopéa de terceira ordem, attenta a debil imaginação de seu auctor, a languidez do estylo, a incorrecção do metro em que fica muito longe da perfeição geralmente observada pelos mesmos contemporaneos, e mais que tudo as frequentes incorrecções de linguagem «que tornam a sua auctoridade de levissimo pezo, e insufficiente para auctorisar o uso de qualquer vocabulo que não tenha mais seguros fiadores» como diz Francisco José Freire nas suas Reflexões sobre a Lingua Portugueza, parte II pag. 93.

O que porém merece n’este auctor mais severa censura, por ser um testemunho flagrante, que depõe contra a sua falta de probidade, ao menos litteraria, são os enormes e visiveis plagiatos que commetteu, furtando quanto poude do Viriato Tragico de Braz Garcia Mascarenhas, que parece seria até seu proximo parente, a julgarmos pela identidade dos appellidos e proximidade das patrias d’ambos. E para não restar sombra de duvida ácerca de quem fosse o verdadeiro plagiario, quando alguem pretendesse acaso passar para Braz Garcia a nodoa que na realidade recáe sobre o caracter de André da Silva, bastará reflectir que a Destruição de Hespanha foi dada á luz por seu proprio auctor em 1671, ao passo que o Viriato Tragico embora se publicasse posthumo em 1699, já existia composto anteriormente ao anno de 1656 em que teve logar o falecimento de Braz Garcia. Fica pois evidentissimo como André da Silva, havendo á mão o autographo, ou copia d’elle manuscripta, quando poucos conheciam o poema, e ninguem talvez esperava que elle sahisse a publico, julgou que podia affoutamente aproveitar‑se dos pedaços que lhe convinham para aformosear a sua obra, sem receio de ser conhecido á face do publico pelo que na realidade era.

O leitor que quizer achar sem trabalho os plagiatos indicados, confira o canto 3.° da Destruição da outava 39.ª por diante até á 69.ª com o canto 2.º do Viriato, outavas 6.ª até 37.ª, e ahi verá as estancias de um textualmente reproduzidas no outro, afora levissimas mudanças, que ainda mais comprovariam, se necessario fosse, quem era o plagiario. – Veja egualmente as outavas 1.ª e 2.ª do canto 20.º do Viriato, com as quaes se fabricaram as 7.ª e 8.ª do canto 5.º da Destruição: e veja ainda n’esse mesmo canto 20.º as outavas 9.ª até 13.ª, que são exactamente as que sob eguaes numeros lhes correspondem no canto 5.° da Destruição. Cuido que não é preciso allegar mais exemplos.

A Destruição de Hespanha é hoje mui pouco vulgar. Os exemplares têem corrido pelos preços de 600 réis até 960 réis, e talvez 1:200, posto que um exemplar que d’elle possuo só me custasse 360 réis, por ter algum estrago de traça.

 

[Diccionario bibliographico portuguez, tomo 1]