D. LUIZ CARLOS DE MENESES primeiro Marquez do Lourical, e Sexto Conde da Ericeira nasceo em Lisboa a 4. de Novembro de 1689. onde teve por Progenitores a D. Francisco Xavier de Menezes Quarto Conde da Ericeira, Mestre de Campo General, Conselheiro de Guerra, e Deputado da Junta dos Tres Estados, e D. Ioanna Magdalena de Noronha filha dos segundos Condes de Sarzedas D. Luiz da Silveira Governador do Reyno do Algarve, Vedor da Fazenda, e Conselheiro de Estado, e D. Mariana de Lencastre e Silva filha herdeira de Ioaõ Gomes da Silva Regedor das Justiças. Com tal excesso se lhe adiantou o juizo á idade que naõ contando mais de quatro annos sabia ler perfeitamente, e formar com excellente primor os caracteres. Aprendeo os primeiros rudimentos das Artes, e Sciencias de seu grande Pay consultando-o como domestico Oraculo em tudo que lhe era dificil ao conhecimento. Exercitado no manejo dos cavallos, jogo das armas, e principios da Geometria, e Fortificaçaõ se resolveo a seguir os belicosos vestigios de seus Mayores para cujo fim entrou a servir na Provincia do Alentejo em o anno de 1710. com o posto de Ajudante de campo de seu cunhado o Conde da Ribeira D. Luiz Manoel da Camara General da Batalha em a mesma Provincia, sendo a primeira ocasiaõ em que mostrou o seu ardor militar no combate da Cavallaria disputado fortemente sobre o rio Fiolhaes. No anno seguinte sendo Coronel do Regimento da Infantaria da Praça de Moura passou ao Alentejo, e ainda que pella idade era neste posto o mais moderno como na disciplina fosse veterano, foy mandado pelo Governador das Armas Pedro Mascarenhas com setecentos Infantes impedir o socorro que os Castelhanos queriaõ introduzir na Praça de Campo Mayor sitiada pelo Marquez de Bay General das Armas Castelhanas cuja empreza dezempenhou com perigo manifesto da vida, e credito immortal do seu nome. Estes heroicos progressos o habilitaraõ para ser eleito Vice-Rey da India a 6. de Abril de 1717. quando contava a florente idade de vinte e sete annos. Chegando prosperamente a Goa a 9. de Outubro do dito anno começou a dispôr os meyos para conservar a gloria daquelle Imperio nascido, e sustentado sobre triumfaes louros, e victoriosas palmas sendo a primeira acçaõ do seu feliz governo a expediçaõ da armada contra a Cidade de Porpatane situada pouco distante da celebre Praça de Dio a qual depois de huma obstinada resistencia foy entrada, e reduzida a cinzas com morte de mil, e quinhentos barbaros, e satisfeitos trinta e outo mil Xarafins de que era devedor ao Estado o Divan da mesma Cidade. A esta vitoria terrestre se seguiraõ tres navaes alcançadas pelo Almirante Antonio de Figueiredo de Utra contra a poderosa armada dos Arabios. Tendo concluido o triennio do seu governo com igual gloria do Estado que recomendaçaõ do seu nome lhe sucedeo em lugar taõ honorifico Francisco Jozé de Sampayo Senhor de Villaflor, e General da Batalha a quem recebeo com todas aquellas significaçoens de afecto que pediaõ a amizade, e o parentesco. Embarcado em a Nao Nossa Senhora do Cabo sahio de Goa a 25. de Janeiro de 1721. e logo começou a experimentar a inconstancia da fortuna passando de prospera a adversa. No Cabo de Camorim se vio quasi sumergido por huma furiosa tempestade, que com tal vehemencia desmastriou a Nao aberta por diversas partes, que foy obrigado a arribar á Ilha de Mascarenhas chamada de Borbon pelos Francezes que a povoaõ onde deu fundo a 6. de Abril. O Governador da Ilha o recebeo com generosa hospitalidade mandando fazer prompto tudo quanto era preciso para reparar a nao, a qual experimentou segunda fatalidade sendo acometida no porto em que estava ancorada por dous piratas Inglezes. Para evitar que naõ fosse despojo da sua cubiça sahio o Conde acompanhado de tres criados e resistindo com a espada aos inimigos que excediaõ o numero de quatrocentos por largo tempo, cahio oprimido da multidaõ depois de ter obrado açoens dignas do seu nascimento e para que naõ perigasse a sua vida bradou o Quartel Mestre que ninguem se atrevesse a ofendello. Com esta ordem cessou o combate, e conduzido o Conde á Nao dos Piratas o trataraõ com grande respeito, e querendo entregarlhe a sua equipagem a naõ aceitou. Acompanhado dos oficiaes das duas Naos entrou na enseada de S. Paulo onde cada huma o salvou com vinte, e huma peças. Neste lugar assistio sete mezes até entrar no Porto hum Navio da Companhia de França que vinha de Moca, e nelle embarcou o Conde a 15. De Novembro e a 4. de Janeiro chegou á Ilha de Santa Elena onde foy generosamente hospedado por seu Governador. Depois de receber distintas honras nas Provincias de Bretanha, Anjou, Toraine, e Orlenois chegou a Pariz a 24. de Abril onde as recebeo mais estimaveis delRey Christianissimo, Duque Regente, e outros Principes da Casa de Rohan com quem tinha parentesco pela Condessa sua mulher. Desta grande Corte partio a 15. de Março de 1722. e em Bayona recebeo particulares favores da Rainha de Espanha viuva de Carlos II. Chegou finalmente a Lisboa a 23. de Junho de 1723. havendo sahido de Goa dous annos quatro mezes, e vinte e outo dias. Nesta Corte viveo alguns annos aplicado á liçaõ dos livros que lhe servia de lenitivo a sua melancolia. Contra a opiniaõ das suas açoens practicadas no governo da India se armou huma tempestade politica mais horrorosa que as que padecera nas viagens, porém de tudo triunfou a sua innocencia authorizada com publicos documentos, de que foy gloriosa consequencia ser nomeado segunda vez Vice-Rey da India a 17. de Abril de 1740. com o titulo de Marquez do Louriçal para onde se fez á vela a 7. de Mayo com huma armada de sete Naos. Nesta jornada por ser feita fora da monçaõ experimentou fataes calamidades que serviraõ de heroico exame á sua tolerancia, sendo obrigado a dar fundo na Bahia de Santo Agostinho na Ilha de S. Lourenço e arribar a Moçambique até que ferrou a barra de Murmugaõ em 13. Mayo de 1741. depois de ter passado hum anno e seis mezes de viagem, naõ havendo memoria de outra semelhante desde o descubrimento da India. Tomou posse do governo a 18. de Mayo que lhe entregou seu antecessor, e particular amigo Pedro Mascarenhas Conde do Sandomil. Para felicitar as suas emprezas militares destinou o dia 13. de Junho consagrado ao grande Portuguez Santo Antonio em cuja madrugada foy inuadida a Fortaleza de Corquem sendo levada por assalto, e rendido o Forte da Coloale com morte de quinhentos barbaros. Estas vitorias que libertaraõ a Provincia de Bardez encheraõ de tal pavor os inimigos do Estado que para naõ padecerem mayores estragos pediraõ pazes que se celebraraõ com immortal gloria das armas Portuguezas a 11. de Outubro de 1741. Com mais plauzivel triunfo se coroou o Vice-Rey abatendo em huma batalha campal o orgulho do Maratà, que arrogantemente entrara pela Provincia de Salcete de que se seguio a entrada das Praças de Sanguem, e Pondá. Neste tempo em que a vigilante providencia, e ardor militar do Vice-Rey se empenhava em novos triumfos permitio a providencia que mortalmente adoecesse, e conhecendo que era chamado para mais perigozo conflito se preparou com as armas dos Sacramentos, que recebidos com summa devoçaõ morreo triunfando, por receber a noticia do rendimento de Pondá antes de espirar, ás 10. horas da noute de 12. de Junho de 1742 . quando contava 52. annos de idade. Foy sepultado como dispuzera no seu testamento na Casa Professa da Companhia de JESUS a o pé do Altar onde se venera o Corpo de S. Francisco Xavier. Celebraraõ-se magnificas exequias á sua memoria, e no fim recitou huma Oraçaõ eloquente o Padre Manoel de Figueiredo Jesuita. Fallou, e escreveo com expediçaõ e pureza as linguas Castelhana, Italiana, e Franceza parecendo a cada hum destas Naçoens que era seu Nacional. Practicou a Portugueza com escrupulosa severidade, naõ admetindo algum termo novo que a corrupçaõ do seculo tem facilitado. Foy muito perito na Historia Sagrada, e Profana principalmente em a do nosso Reyno, como tambem em o estudo das Medalhas antiguas, e monumentos Romanos. Cazou em 20. de Abril de 1709. com D. Anna Xavier de Rohan filha primogenita do Conde da Ribyeira D. Jozé da Camara Presidente do Senado de Lisboa, Senhor, e Capitaõ General da Ilha de S. Miguel, e da Condessa Constança Emilia de Rohan filha dos Principes de Soubisse Francisco de Rohan, e Anna Chabot de Rohan. De taõ dignissima espoza teve a D. Francisco Xavier de Menezes II. Marquez do Louriçal e Sexto Conde da Ericeira que cazou a 2. de Mayo de 1740. com D. Maria Jozé da Graça, e Noronha filha unica dos Terceiros Marquezes de Cascaes D. Manoel Jozé de Castro Gentilhomem da Camara de Sua Magestade, e Conselheiro de guerra, e de D. Luiza Maria de Noronha filha dos primeiros Marquezes de Angeja D. Pedro Antonio de Noronha General da Cavallaria, Governador das Armas do Alentejo, Vice-Rey da India, e do Brasil, Conselheiro de Estado, e Vedor da Fazenda, e de D. Izabel Maria de Mendoça: D. Constança Aureliana Xavier de Menezes que se despozou a 2. De Mayo de 1740. com Jozé Feliz da Cunha e Menezes primogenito de Manoel Ignacio da Cunha de Menezes Alcaide mór, e Commendador de Tavira, e de D. Thereza de Menezes de cujo matrimonio tem larga sucessaõ. D. Jozé Vicente Xavier de Menezes que morreo a 22. de Outubro de 1723. quando contava 10. De idade. D. Ioanna de Menezes que morreo a 26. de Julho de 1715. D. Margarida Xavier de Menezes, que falleceo a 8. de Dezembro de 1727. D. Fernando Xavier de Menezes que morreo a 31. de Dezembro de 1740. D. Henrique de Menezes, e Toledo Conego da Santa Basilica Patriarchal. As açoens politicas, e militares do Marquez do Louriçal se podem ler mais difusamente escritas na Vida que lhe escreveo meu Irmaõ D. Jozé Barboza Clerigo Regular, Chronista da Serenissima Casa de Bragança, Academico, e Censor da Academia Real, que sahio impressa no 1743. Compoz.

Oraçaõ recitada no Paço em 17. de Mayo de 1736. quando foy eleito Academico da Academia Real. Sahio na Collec. dos Docum. da dita Acad. do anno de 1736. Lisboa por Jozé Antonio da Silva 1736. 4.

Complemento ao doutissimo Vocabulario do Padre D. Rafael Bluteau Clerigo Regular e Academico da Academia Real. fol. 3. Tom. M. S. Consta de utilissimas emendas e eruditos additamentos.

Cathalogo da vastissima Bibliotheca de seu pay o Conde da Ericeira D. Francisco Xavier de Menezes. He escrito por sua propria maõ dividido por materias, e classes com distribuiçaõ dos seculos em que viveraõ os Authores, e notando as mais correctas ediçoens das suas obras

Supplemento ao Diccionario Historico de Morery. Foy remetido a Pariz, e nelle emendou muitas noticias pertencentes á Topographia do Reyno de Portugal, escreveo diversas Genealogias de familias illustres do mesmo Reyno, e os elogios de Varoens insignes, que nelle floreceraõ, dos quaes transcreveo muitos o Padre Niceron nas Memoir. des Hom. Illustr. Historia das Familias illustres Portuguezas, que passaraõ ao Oriente desde o seu descubrimento até o anno de 1741 fol. M. S.

 

[Bibliotheca Lusitana, vol. III]