D. Fr. LUIZ DA SILVA naceo em Lisboa a 27. de Outubro de 1626. Foy filho illegitimo de Francisco da Silva, e de Margarida de Noronha neto de D. Luiz da Silva Alcaide mór, e Commendador de Cea em a Ordem de Aviz, Governador da Relaçaõ do Porto, Mordomo mór da Casa Real, Vedor da Fazenda, Conselheiro de Estado, e irmaõ de Fernaõ Telles da Silva primeiro Conde de Villar-Mayor Regedor das Justiças, e Mordomo mór da Rainha Dona Luiza Francisca de Gusmaõ. Instruido nas letras humanas recebeo o habito da Illustre Ordem da Santissima Trindade em o Convento patrio a 25. de Junho de 1641. onde brilhou o seu talento igualmente na Cadeira, e no pulpito sendo profundo Theologo, e eloquente Orador. Foy Reytor do Collegio de Coimbra. e subira aos mayores lugares da Religiaõ se o naõ chamassem fora della mais eminentes dignidades sendo a primeira que teve a de Bispo titular de Titiopoli Cidade de Isauria na Armenia Mayor Suffraganea do Arcebispado de Seleucia no Patriarchado de Constantinopla, para fazer os Pontificaes na Capella Real em cuja dignidade o sagrou Luiz de Souza Capellaõ mór a 30 de Agosto de 1671. donde subio a Deaõ da Capella Real em o primeiro de Março de 1675. pela promoçaõ de Francisco de Mello de Castro a Prior mór de Aviz, e a Deputado da Junta dos Tres Estados. Vagando o Bispado de Lamego por ser transferido delle á Cadeira primacial de Braga D. Luiz de Souza Embaxador á Curia Romana, foy nomeado naquella Mitra de que tomou posse a 29. de Mayo de 1677. donde passou para a da Guarda em cuja Cidade foy recebido com plausiveis demostraçoens a 6. de Junho de 1685. e nestas duas Diocezes publicou as Constituiçoens para refórma de abuzos, e recta administraçaõ dos Sacramentos. Ultimamente por morte de D. Fr. Domingos de Gusmaõ da preclarissima Ordem dos Prégadores, e parente do seu illustre Fundador, que ocupava o Arcebispado de Evora, foy elevado a esta Metropole a 5. de Janeiro de 1691. Em todas estas Diecezes se constituhio hum perfeito exemplar dos Prelados da primitiva Igreja. No pulpito, e no confissionario derigia com saudaveis documentos as suas ovelhas para naõ serem pasto da voracidade infernal. Todas as rendas dispendia em beneficio da pobreza resgatando com esmolas copiosas a innumeraveis donzelas, viuvas, e pupillos da extrema necessidade que padeciaõ. Assistia aos moribundos, e aos emfermos ensinando a estes a tolerancia nas molestias como acredora da remuneraçaõ eterna, e áquelles a resignaçaõ na divina vontade para se coroarem felismente no Paraizo. Sublimado á Cadeira Metropolitana de Evora parece incrivel a generosa profusaõ, e charitativa liberalidade com que distribuia o amplissimo patrimonio que possuia em remedio da pobreza, e obsequio do culto Divino. Ornou a sua Espoza de preciosos paramentos com que se Vestiraõ os Altares, e se cubriraõ as paredes sendo o mais estimavel donativo a Custodia em que está o Santo Lenho, formada de ouro, e guarnecida de 402. Pyropos, 180. esmeraldas, e 840. Diamantes onde o arteficio he taõ primoroso que excede o valor, e preciosidade do metal, e das pedras. Fundou o Collegio para os moços do Coro da Cathedral. Redificou o Convento do Paraizo das Religiosas Dominicas, e erigio hum dormitorio em o de S. Jozé de Carmelitas Descalsas. Dispendeo na Sancristia do Convento do Carmo vinte mil Cruzados. Reparou os Recolhimentos da Piedade, e da Magdalena. Concorreo com quarenta mil cruzados para a nova Fundaçaõ dos Padres da Congregaçaõ do Oratorio em a Villa de Estremoz. Estabeleceo sobre a Mitra com faculdade Pontificia huma pensaõ perpetua de outenta mil reis para sustentaçaõ de dous Noviços da Companhia de Jesus da Provincia do Malabar. Edificou a Capella mór do Convento dos Religiosos Trinos em Alvito, e o Retabolo da Igreja Matriz de Monte-Mór o novo. Para que sem confuzaõ se destribuissem as esmolas que se davaõ á porta do seu Palacio, ordenou que aos homens se desse dez reis a cada hum na segunda, quarta, e sexta feira de cada semana; que ás mulheres na Terça, Quinta, e Sabbado; e nos Domingos meyo tostaõ a cada Estudante. Na Sexta feira de cada mez se vizitavaõ as Cadeas Eclesiastica, e secular e a cada prezo se davaõ dez tostoens. Foy muito parco na meta, e austero no ornato da Casa parecendo mai s de Religioso observante, que Prelado magnifico. O sustento quotidiano com que se alimentava procedia da esmola de cento, e vinte reis da Missa, que dizia todos os dias pelas suas ovelhas a qual recebia hum Pagem seu confidente da maõ do Esmoler. Para evitar a perniciosa ignorancia da Doutrina Christaã em o seu rebanho, mandou imprimir hum Compendio della, que distribuiõ por toda a Dioceze ordenando com severa cominaçaõ aos Confessores que naõ admetissem no Confessionario, e aos Parochos á Comunhaõ, e Matrimonio os que naõ soubessem tudo quanto era necessario para a salvaçaõ. Acometido de huma doença maligna no anno de 1701. se restituhio a sua antigua saude por intercessaõ do Principe dos Apostolos a cujo culto tinha edificado hu Templo. Passado hum anno cahio mortalmente emfermo cuja noticia consternou fatalmente a todas suas ovelhas fazendo publicas Preces e Procissoens pela sua vida da qual estavaõ pendentes as suas, e como em huma das Procissoens fosse levada huma Imagem de Maria Santissima á sua Camara levantando os olhos para taõ Soberana Princeza mais com lagrimas, que vozes lhe fez huma enternecida supplica a que deu principio com as palavras de Santa Izabel. Unde hoc mihi ut veniat Mater Domini mei ad me. Depois de receber com summa piedade os Sacramentos expirou placidamente a 13. de Janeito de 1703. quando contava 76. annos, dous mezes, e 17. dias de idade sendo Bispo de Lamego sette, da Guarda 6. e Arcebispo de Evora, treze. Foy sepultado na Capella do Santo Lenho a qual como fosse demolida com a nõva fabrica da Capella mór em o anno de 1721. foy transferido para outra sepultura fronteira a mesma Capella do Santo Lenho sobre a qual se lhe gravaraõ as suas Armas com este epitaphio.
Sepultura do Senhor D. Fr. Luiz da Silva Tellez Religioso da Santissima Trindade da Illustrissima Familia dos Silvas Tellez, Mestre em Theologia, Bispo Deaõ da Capella Real da Junta dos Tres Estados, Bispo de Lamego, e da Guarda, Arcebispo de Evora, insigne no pulpito, magnifico Bemfeitor das suas Igrejas, singular Esmoler para os Religiosos, admiravel na Charidade para com os pobres, e perfeito exemplar de Prelados. Falleceo em Evora com ditoza morte a 13. de Janeiro de 703. aos 76. de idade. Vivirá para sempre Amen.
Celebraõ a sua memoria Varios Escritores o Padre D. Manoel Caetano de Sousa Cathal. dos Bisp. Portug. p. 285. Foy grandissimo esmoler, e muito douto. Padre Franc. da Foncec. Evor. glorios. p. 310. n. 545. Exemplar, e modelo de santos, e virtuosos Prelados. O Doutor Manoel Per. da Silv. Cathal. dos Bisp. da Guard. §. 41. Governou as Prelasias com summa inteireza, charidade, e rectidao. Godinho Vid. do V. Fr. Antonio das Chagas liv. 1. cap. 24. meritissmo de mayor cadeira por seu sangue, letras, e virtude, principalmente pela sua charidade em que se faz outro S. Joaõ Esmoler Patriarcha de Alexandria. Salazar Hist. Geneal. da Cas. dos Silv. Part. 2. liv. 9. cap. 16. Franc. de Sant. Mar. Diar. Portug. Tom. 1. pag. mihi 68. digno de eterna recordaçaõ pela liberalidade com que dispendeo as suas grandes rendas em beneficio dos pobres. Fr. Man. de Sá Mem. Hist. da Prov. do Carm. de Portug. Part. 1. liv. 3. cap. 18. Foy hum dos mais exemplares, e caritativos Prelados que tem tido este Reyno. Barboza Fast. da Antig. e nov. Lusit. Tom. 1. pag. 157. Luzirão tanto as suas virtudes Episcopaes, que era verdadeiro retrato dos Prelados que illustrarao a Igreja com resplendores de Santidade.
Compoz.
Sermaõ do Acto da Fé, que se celebrou no Terreiro do Paço desta Cidade de Lisboa em o 1. de Dezembro de 1673. Lisboa por Antonio Crasbeeck de Mello 1674. 4.
Sermaõ nas Exequias do Excellentissimo Senhor Luiz Alvares de Tavora Conde de S. Joaõ, Marquez de Tavora. Lisboa por Antonio Rodrigues de Abreu. 1674. 4.
Sermaõ do Mandato na Capella Real. Lisboa por Miguel Manescal 1686. 4. Era neste tempo Bispo da Guarda.
Sermaõ de S. Caetano prègado no Convento da Santissima Trindade de Lisboa M. S. 4.
Apologia em defensa da Jurisdiçaõ Ordinaria fundada nas rezoens de Direito, e doutrina dos Santos Padres M. S. fol. Era neste tempo Bispo de Lamego. Tratado em que se prova nao dever aplicarse as penas pecuniarias, e as commutaçoens dos degredos à Bulla da Santa Cruzada M. S. fol.
Tratado em que se prova ser indecente aos Ecclesasticos ver Comedias. fol. M. S. Desta obra faz mençaõ o Padre D. Manoel Caetano de Sousa no lugar assima citado onde affirma que este grande Prelado escrevera varios Tratados Theologicos, e Canonicos muito doutos que desapareceraõ com a sua morte.
[Bibliotheca Lusitana, vol. III]