D. NICOLAO MONTEIRO. Naceo em a Cidade do Porto a 6 de Dezembro de 1581, onde teve por Progenitores a Nicolao Velho, e Maria Monteiro. Nos primeiros annos mostrava tal modestia no semblante que servia de exemplar aos moços, e de censura aos velhos. Escudadas na patria as letras humanas passou á Universidade de Coimbra, onde aplicado á Jurisprudencia Canonica se distinguio pela viveza da comprehensaõ de todos os seus condiscipulos, e recebida a borla doutoral naquella Faculdade se restituhio á sua patria, donde sahio a tratar na Curia Romana hum negocio grave de huma pessoa authorizada. Tanto que chegou a Roma se opoz a hum Canonicato da Cathedral de Coimbra, e sendo os opositores insignes Letrados a todos foy preferido com grande credito da sua literatura. Concluido felizmente o negocio na Curia voltou para o Reino, e no mesmo tempo que residia em Coimbra servindo o Canonicato exercitou o lugar de Vigario Geral desta Diocese com summa integridade, pela qual padeceo varios insultos que dissimulou prudente. Ocupava o Priorado da celebre Collegiada de S. Martinho de Cedofeita seu Tio Joaõ Alvres Moutinho, e querendo deixar substituto capaz de taõ grave Beneficio o resignou em seu sobrinho, cuja eleiçaõ mostrou o acerto com que fora feita. Informado o Serenissimo Rey D. Joaõ IV. da sua profunda capacidade, e maduro talento o mandou a Roma no anno de 1645 para representar á Santidade de Innocencio X. a injustiça com que negava o provimento dos Bispados de Portugal. Com a voz, e com a penna explicou ao Summo Pastor os lastimosos gemidos das ovelhas de tantos rebanhos reduzidas ao ultimo desemparo por falta de Pastores que lhe ministrassem o alimento espiritual. Naõ foraõ efficazes estas suplicas para que o Pontihce como Pay universal se compadecesse das espirituaes opressoens, que padecia o Reino de Portugal, antes concitado contra o seu Ministro o furor Castelhano se resolveo a despojallo da vida, que Deos com particular providencia lhe conservou livrando-o de huma bala, que matou a hum dos seus criados. Resoluto o Pontifice castigar severamente o author de taõ sacrilego insulto, lhe rogou instantemente se sepultasse em eterno silencio huma acçaõ, cuja memoria seria sempre injuriosa á Naçaõ Castelhana; e como conhecesse ser infructuosa a sua assistencia na Curia em que dominava mais o obsequio do respeito, que o amor da justiça partio de Roma, e chegando a Portugal, foy residir na sua Collegiada de Cedofeita. Della o separou a nomeaçaõ que fez da sua pessoa ElRey D. Joaõ IV. sendo ja Mestre Escola da Collegiada de Barcellos para Mestre do Principe D. Theodosio, e seus irmãos os Infantes D. Affonso, e D. Pedro, em cujo ministerio deu a conhecer mais claramente a capacidade do seu talento, pois sem diminuiçaõ do decoro devido á soberania dos seus discipulos os reprehendia daquellas imperfeiçoens, que podiaõ acusar de menos vigilante, e zeloso o seu magisterio. Crecendo o seu merecimento com a idade foy eleito em 3 de Dezembro de 1646. Bispo de Portalegre, e no anno de 1655 da Guarda dos quaes naõ teve confirmaçaõ. Amante da tranquilidade da sua Collegiada, como inimigo do tumulto da Corte suplicou a ElRey, que lhe permitisse licença para se retirar á sua patria, pois o numero dos annos o dispensava do magisterio, e defirindo ElRey a taõ justificada suplica ordenou que se lhe continuasse a moradia que percebia em Lisboa, a qual heroicamente regeitou dizendo que naõ podia utilizarse dos emolumentos do Officio, que naõ exercitava. Retirado á Collegiada de Cedofeita vivia para Deos ocupando a mayor parte do tempo em devotos exercicios. Naõ consentio o Principe D. Pedro que seu Mestre naõ fosse premiado, como pediaõ os seus merecimentos, e logo que tomou a Regencia da Monarchia, o nomeou Bispo do Porto insinuandolhe na Carta, que lhe seria muito grato o seu consentimento pois delle tinha recebido a doutrina, como discipulo. Obrigado da Real insinuaçaõ aceitou a dignidade, em que foy confirmado pela Santidade de Clemente X. e sagrado pelo Nuncio Apostolico Francisco Ravizza em a Igreja dos Padres da Congregaçaõ do Oratorio de Lisboa em 31 de Mayo de 1671. Foy recebido com geral aplauso na sua Diocese a 26 de Julho, onde praticou as virtudes de hum perfeito Prelado. Deputou dous esmoleres para destribuiçaõ das esmolas, hum dos pobres, que concorriaõ ao seu Palacio, e outro daquellas pessoas, cujo nacimento, e honestidade lhes impediaõ pedir socorro para suas necessidades. Com magnifica, e piedosa despeza reformou a Igreja de S. Pedro de Miragaya, e novamente edificou a Parochia de S. Nicolao, onde com o nome deste grande Taumaturgo recebeo a primeira graça. Todos os dias celebrava o incruento Sacrificio da Missa, para o qual se preparava com huma hora de Oraçaõ mental naõ lhe causando impedimento para taõ dilatado exercicio a provecta idade de 90 annos. Recebidos os Sacramentos com summa piedade, falleceo em 20 de Dezembro de 1672, quando contava 91 de idade. Jaz sepultado na Capella mór da sua Cathedral. Celebraõ o seu nome Joan. Soar. de Brito Theatr. Lusit. Litter. lit. N. n. 5. D. Franc. Manoel de Mello Cart. 1. da Cent. 4. das suas Cartas. Sylva Cathal. dos Bisp. da Guarda. Fr. Fernando da Soledad. Hist. Seraf. da Prov. de Portug. Part. 5. liv. 4. cap. 34. Compoz

Relaçaõ das verdadeiras Resoens em favor do Estado Ecclesiastico deste Reino de Portugal feita em Roma no principio do anno corrente superabundante ás que alli hariaõ feito pelo mesmo Reino no anno de 1642 os Bispos de Lamego, e Eleito de Elvas. Lisboa, por Paulo Crasbeeck 1645. 4.

Vox Turturis Portugallia gemens ad Pontificem Summum pro Rege suo ut audiatur justa gemit, ac clamat: clamat namque, ac gemit jure Civili, humana actione, ordinatione divina, ac obsequio regio animata. Ulyssipone apud Dominicum Lopes Roza. 1649. 4.

Ballidos das Igrejas de Portugal ao Supremo Pastor Summo Pontifice Romano pelos tres Estados do Reino. Pariz por Sebastiaõ Cramoisy. 1653. 8. Sahio vertido na lingoa Latina com este titulo

Balatus ovium; opus a tribus Lusitanici Regni Ordinibus Supremo Patri, & Summo Pontifici D. N. Innocentio X oblatum. ibi per eumdem Typog. eod. anno 8.

Esta obra, como a traduçaõ sahio sem o nome do Author.

 

 [Bibliotheca Lusitana, vol. III]